Chocolates bean to bar estão invadindo o mercado, tanto brasileiro quando internacional, com novas marcas sendo lançadas todos os meses, pois eles atendem aos desejos dos consumidores que procuram conhecer o que estão consumindo, de onde vem os ingredientes e como são feitos, que se preocupam com transparência e sustentabilidade. É o seu caso?
O termo bean to bar tem a tradução “do grão do cacau à barra do chocolate”, mas na verdade tem várias interpretações, o que pode confundir o consumidor. Eu mesma já pensei muito no que seria uma definição, já que escrevo sobre isso desde 2015, quando descobri esse tipo de chocolate e me encantei com o conceito.
Depois de conhecer muitas marcas, estudar casos, perceber as diferentes nuances e possibilidades e conversar com especialistas, cheguei à conclusão do que é importante para mim nesse conceito. Pensando nisso, listei 9 pontos relevantes para você ver se coincidem com o que você procura em um chocolate ou o que você acredita ser bean to bar. E tudo bem se você não concordar com algo, pois como eu disse, existem várias interpretações. O importante é perceber o que tem por aí para poder fazer as SUAS melhores escolhas para você.
Esses são os 9 pontos relevantes que eu acredito no bean to bar:
#1 Não existe definição oficial de “bean to bar”
Existem diferentes interpretações, algumas simplistas, outras puristas e as intermediárias. Confesso que tendo para o lado mais purista, mas com certa flexibilidade para esse momento em que o mercado ainda está se formando.
A interpretação simplista de bean to bar é “o chocolate feito do grão do cacau à barra do chocolate”. Ela apenas diferencia o chocolate pelo ingrediente inicial, que são grãos de cacau, ao contrário de quem parte da massa de cacau ou de um chocolate pronto para remoldar. Não fala nada dos ingredientes e nem de como é feito ou por quem, ou seja, não significa nada. As grandes empresas já estão tentando usar o termo “bean to bar” com a desculpa que compram bean e vendem bars. Não caia nessa!
A interpretação purista é rígida, muitas vezes focada em apenas 2 ingredientes (cacau fino e açúcar), algumas origens de cacau com genética mais apurada, rastreabilidade comprovada em toda a cadeia produtiva, eventual uso de manteiga de cacau de mesma origem dos grãos, etc. Acho interessante, mas na realidade poucas marcas se encaixam aqui e pode não ser escalável, e consequentemente é difícil de ser sustentável. Por isso acho válido ter alguma flexibilidade, pelo menos por enquanto.
Então vamos à minha versão “purista levemente flexível”!
#2 O conceito “bean to bar” que faz mais sentido para mim é:
Bean to bar é o chocolate feito do grão do cacau à barra do chocolate, em pequenos lotes, pela mesma empresa sem terceirizar nenhuma parte do processo, com foco no sabor do cacau, na transparência e na sustentabilidade.
É um chocolate mais puro e justo!
Entenda melhor em nos itens #3, #4 e #5
#3 Na prática, FOCO NO CACAU significa que:
- É usado cacau fino e de origem conhecida (ou seja, pós-colheita adequado resultando em mais sabor e menos amargor, acidez e adstringência);
- O chocolate contém mais cacau e menos açúcar;
- Não contém gorduras substitutas da manteiga de cacau;
- Não contém aromatizantes de nenhum tipo*;
- Não contém ingredientes artificiais;
- Não se procura com padronização de sabor. Quem faz bean to bar procura mostrar o melhor que cada lote de cacau fino pode dar, ou seja, tem foco em qualidade sensorial (sabor e sensações na boca).
Isso não existe na indústria tradicional, onde o foco é o açúcar, o aromatizante, a padronização de sabor , o baixo custo e a grande quantidade.
*Não confundir aromatizantes com inclusões. Aromatizantes tem função de corrigir ou modificar o sabor (em geral aparecem em vários produtos da marca, exemplo: baunilha). Inclusões tem função de harmonizar ou complementar o chocolate (então cada inclusão aparece uma vez na linha de produtos, exemplo café).
#4 Na prática, a TRANSPARÊNCIA significa que:
- O consumidor pode saber de onde vem o cacau, quem cria e faz o chocolate, como e onde. Pode até conhecer o chocolate maker ou equipe;
- São usados poucos ingredientes e naturais;
- Informações claras, legíveis e disponíveis, tanto na embalagem quando online e em toda a forma de comunicação;
Isso não existe na indústria tradicional, onde há o segredo industrial e letras miúdas.
$5 Na prática, a SUSTENTABILIDADE significa que:
- Há preocupação com sustentabilidade ambiental , tanto na fazenda de cacau quanto na fábrica de chocolate.
- Há preocupação com sustentabilidade social, principalmente com a valorização de toda a cadeia produtiva;
- Pelo cacau é pago o preço justo, que em geral é definido pelo próprio produtor;
Isso não existe na indústria tradicional, onde é ela quem determina o preço do cacau e o produtor é explorado ao ponto de serem comuns acusações de trabalho infantil.
#6 Não há garantia de que você vai gostar do bean to bar porque ele é totalmente diferente do chocolate tradicional
Crescemos consumindo chocolates feitos com muito açúcar, aromatizantes e cacau comum, em geral torrado demais. Aprendemos que isso era bom e criamos fortes memórias afetivas através deles. Aprendemos que chocolate tem que ser doce e que o chocolate amargo tem que ser amargo (na verdade, os melhores chocolates não são assim). Depois de tantos anos, é difícil mudar o paladar e esquecer aquelas emoções. Nem todos querem ou conseguem.
Sei que quando o paladar se desconecta daqueles sabores artificiais, um mundo novo se abre, cheios de boas sensações, mas nem sempre as pessoas percebem isso na primeira vez que provam bean to bar. Então vale a pena provar mais de uma vez.
#7 Nem todo chocolate bean to bar é bom
Bean to bar é um conceito, não uma garantia de qualidade, portanto é possível topar com um bean to bar não tão bom. Pois é, é verdade. Pode ser devido ao clima que afeta a safra do cacau, pode ser uma pequena alteração num lote de produção (já que é tudo artesanal!) ou um chocolate maker ainda formando sua experiência (o que leva tempo mesmo). Tudo isso é possível de mudar para melhor na safra seguinte!!!
Não é fácil trabalhar com ingredientes naturais e a padronização do resultado não é o objetivo, então variações de sabores em lotes são até esperadas e, às vezes, a gente não gosta do resultado. Não é a maioria das vezes, mas acontece. Considere também que nossos paladares também estão em “treinamento” constante para esses novos sabores, ou seja, talvez, eventualmente, o que você acha que não é bom, pode ser bom para os outros!
Se você não gostar de uma marca, experimente outro lote ou escolha outra marca. Não desista, pois o bean to bar, no mundo todo e principalmente no Brasil, está apenas começando.
#8 Quando parece bean to bar, mas não é, mesmo sendo bom
Existe uma tendência no mercado que não se encaixa no que eu chamo de bean to bar, mas que podem ser tão bons quanto eles, na boca e na intenção de ser sustentável.
É a terceirização da produção, quando uma marca genuinamente bean to bar presta o serviço de fabricar o chocolate para outra marca. em geral de outro nicho. Por exemplo, um restaurante que quer ter o chocolate da sua marca, mas não quer produzir. Ele contrata uma marca bean to bar, mas como ele não faz chocolate, ele não vai ser bean to bar (não no meu conceito, pelo menos!). Mas vai ser, na boca, tão bom quanto o da marca que ele contratou.
A terceirização não é um problema, desde que não tente te enganar dizendo ser uma coisa que não é, ou seja, esse chocolate não deve ser vendido como “bean to bar”. Lembra que transparência é um dos pilares que eu falei acima? Nós, consumidores, não queremos ser enganados.
Não compre apenas porque está escrito bean to bar, procure saber quem fez. Leia no verso da embalagem o “Produzido por” e tire suas conclusões (eu já fico com o pé atrás quando vejo ali só o CNPJ e não a razão social do fabricante).
#9 Alguns pontos do conceito “bean to bar” ainda são discutíveis
Por exemplo, o limite do tamanho do “pequeno lote”, o uso de lecitina, o uso de manteiga de cacau desodorizada ou a possibilidade de compartilhamento de equipamentos por diferentes marcas (na torra, por exemplo), tudo isso ainda divide as opiniões dos profissionais desse nicho sobre como cada um desses detalhes afeta a qualidade do chocolate.
É tão discutível, que nos Estados Unidos muitas marcas substituíram o termo “bean to bar” por “craft”! Ou seja, nada é definitivo. Então tudo isso que eu escrevi reflete o que eu penso em maio de 2022.
Não dá para saber se “bean to bar” vai se solidificar como um termo relevante ou não no longo prazo, mas eu acredito que o conceito continuará forte, porque é uma demanda dos consumidores.
Conclusão
O conceito “Bean to bar” me encanta e os chocolates que eu procuro são baseados nisso. Eu leio lista de ingredientes, pesquiso se foi mesmo a própria marca que produziu ou se foi terceirizado e reparo nas informações divulgadas pela empresa no site e nas redes sociais, tudo isso para ver se a marca se encaixa no que estou procurando, que é um chocolate puro e justo. Isso me ajuda a tomar decisões de compra mais conscientes.
Entendo que esse é só o meu ponto de vista e sei que tem gente que não concorda.
Acho que existe chocolate para todo perfil de consumidor e existe consumidor para todo tipo de chocolate. O legal é que você é livre para escolher mais de um tipo de chocolate! Pode navegar por todos eles, por exemplo, numa hora degustando um bean to bar e depois comendo um M&M no cinema. A opção é sua. Viva a diversidade !
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