Chocolate, Culture and Politics of Food

Esse é um curso da Harvard University que já acontece há vários anos e é destinado a pessoas que querem aprender sobre a história do cacau e do chocolate e sua trajetória desde séculos atrás até se transformar no que conhecemos como “chocolate” hoje.

O chocolate não foi inventado como barras e bombons que estão sempre disponíveis em quase todo canto como agora, mas começou como uma bebida amarga que era consumida por uma elite em cerimônias especiais centenas de anos atrás. O curso trata não só dos aspectos tecnológicos que possibilitaram essa transformação, mas principalmente dos aspectos humanos, das relações nas sociedades e como cada uma delas interagiu com o cacau nos últimos 3.000 anos. Cacau e chocolate estavam presentes na vida dos povos olmecas, astecas e mayas nas Américas, passaram pela época das colonizações que envolveram europeus, africanos e asiáticos, daí veio a revolução industrial que mudou todo o cenário. A globalização expandiu tudo ainda mais e agora acontece a ainda minúscula “revolução” bean to bar.

Fiz esse curso no primeiro semestre de 2022 e queria contar como foi. O objetivo é incentivar que mais pessoas o façam, pois acredito que o futuro pode ser muito melhor quando temos consciência do passado. Eu venho estudando sozinha sobre cacau e chocolate nos últimos 7 anos e esse curso foi excelente porque me deu acesso a informações que eu nunca encontraria sozinha (ou seria muito difícil).

Dra Carla Martin, FCCI e Harvard

O curso é dado pela dra. Carla D. Martin, que é antropóloga, faz parte do Departamento de Estudos Africanos e Afro-americanos na Harvard  University, é fundadora e diretora do FCCI Fine Cacao and Chocolate Institute (vale a pena conhecer o site e seguir seus perfis nas redes sociais) e é expert em cacau e chocolate. O FCCI desenvolveu cursos de análise de cacau e chocolates finos, apresentados tanto pela Carla quanto pelo José López Ganem. Ele guiou as degustações que fizemos no curso da Harvard.

A dra Carla já esteve algumas vezes no Brasil e já escreveu sobre as condições de trabalho na indústria do cacau brasileiro, textos que foram publicados aqui no blog (leia aqui e aqui). Fora isso, ela me convidou para um evento do FCCI na Harvard University para apresentar e guiar uma degustação dos chocolates vencedores do Prêmio Bean to Bar Brasil em 2019 (veja aqui). Ela participou como jurada da edição 2020 do Prêmio.

 


Dra Carla Martin numa das aulas do curso Chocolate, Culture and Politics of Foods

Como é o curso na Harvard

O que você precisa saber para fazer esse curso:

  1. O curso é parte do Harvard Extension School e pode ser feito por alunos regulares da Harvard University (modalidade que conta créditos para diploma de graduate ou undergraduate) e também por pessoas que querem apenas um curso avulso (modalidade “non-credit”, que foi meu caso).
  2. Não é um curso que tem disponível todo o tempo. É preciso ficar ligado nas redes sociais da dra Carla ou do FCCI para saber quando abre nova turma, sempre em início de semestre letivo nos Estados Unidos (eu fiz de janeiro a maio/22).
  3. É tudo em inglês e para se matricular é necessário provar que você tem um bom nível no idioma para acompanhar as aulas, o que pode ser feito de 2 formas: com certificado TOEFL ou com certificado Duolingo English Test. O TOEFL leva um tempo para tirar. Eu fiz o do Duolingo que custou US$ 49 e levou 2 dias para sair o certificado (após fazer a prova, em casa, no horário da minha escolha). O certificado é enviado pelo Duolingo para a Harvard, portanto é bom não deixar para a última hora. Se você tem interesse de fazer esse curso, sugiro já providenciar um dos certificados para ter pronto na hora da inscrição, pois o prazo é curto.
  4. São aulas online, via Zoom, que eram toda quarta-feira das 17:10 às 19:00 (horário de Boston). Para quem não pode assistir no horário, as aulas ficavam gravadas, mas na aula ao vivo dava para interagir com os participantes via chat ou no próprio vídeo, o que é muito interessante, então não faltei nenhuma aula.
  5. As aulas são só a ponta do iceberg! Tem vários materiais para serem lidos antes de cada aula, entre livros inteiros, capítulos de livros, artigos acadêmicos e publicações, além de alguns vídeos e documentários. Tudo em inglês e alguns artigos em vocabulário mais técnico, que acabam tomando mais tempo de alunos que não tem o inglês como língua nativa, como eu. E, sim, precisa ler o material antes da aula para poder acompanhar o curso (não tem sentido pagar e não aprender tudo, né?). Teve uma aula que teve discussão em grupo e eu não tinha tido tempo de ler um dos materiais, que foi justamente o que foi discutido. Eu não aproveitei tanto aquela aula como poderia.
  6. Eu fiz o curso pelo conhecimento, não pelo diploma, então optei pelo modelo “non-credit”, então não tive obrigação de fazer as provas, nem de participar dos fóruns de discussão e nem de entregar o trabalho final que é uma dissertação (escolhi fazer todos as provas e fui super bem, não entreguei o trabalho final, mas ele vai sair aqui no blog em forma de post).
  7. É um curso pago, por volta de US$1.700. Não há parcelamento e o pagamento é por cartão de crédito.
  8. Todo material do curso, links para Zoom, fórum de discussão, testes e meios de contato com participantes são feitos através da plataforma Canvas, acessível via web ou app de celular. Bem prático.
  9. Para quem opta por “non-credit”, o material fica disponível por apenas 1 mes após o final do curso (e foi a única coisa que me decepcionou, porque eu imaginei que ficaria disponível mais tempo e gostaria de voltar e rever algumas aulas, mas de repente não estavam mais lá).

Conteúdo do curso

Unit 1: Origins

  • Introduction
  • Mesoamerica and “the food of the gods”
  • Chocolate expansion

Unit 2: Growing Cacao, Making Chocolate, Selling Sin

  • Popular sweet tooth and scandal
  • Slavery, abolition and forced labor
  • The rise of big chocolate and race for the global market

Unit 3: Representation, Labor, and the Ethics of Trade

  • Modern day slavery
  • Race, ethnicity, gender, and class in chocolate advertisements
  • Alternative trade and virtuous localization /globalization

Unit 4: Eating Chocolate

  • Health, nutrition, and the politics of food
  • Terroir and taste
  • The food movement, haute patisserie, and artisan chocolate: the future?

As aulas são muito bem organizadas e a Carla tem um jeito todo especial e bem didático de apresentar todos esses tópicos, dos mais divertidos aos mais sombrios (como é o caso da parte sobre exploração humana, escravidão, etc). É um prazer assistir as aulas dela, eu já era super fã, agora sou mais ainda.

Fora isso, tivemos 3 degustações de chocolates guiadas por José López Ganem, pesquisador e membro do FCCI, além de expert em cacau e chocolates. Ele também foi jurado da edição 2020 do Prêmio Bean to Bar Brasil.

Antes da pandemia, esse curso era presencial na Harvard e tinha as degustações lá, com chocolates escolhidos por eles. Mas agora é tudo online e as degustações foram organizadas de forma que todos pudessem participar com chocolates que tivessem disponíveis nas suas regiões (na minha turma tinha alunos de vários países e fusos-horários!).

As degustações aconteceram em 3 dias diferentes, de acordo com o que foi sendo apresentado nas aulas. Degustamos chocolates industrializados, depois chocolates certificados e, por último, craft chocolates (o que aqui chamamos de bean to bar artesanais). É sempre uma delícia conversar e degustar chocolates com o José! Adoro o jeito dele de dar aula também (viva o México!).

Também teve a participação da Margaret Ann Simonetta, assistente da Carla, super simpática e atenciosa, que ao final nos deu uma aula de Chocolate no mundo do Harry Potter. Amei! Já tinha lido todos os livros e assisti mais de uma vez os filmes, então achei muito interessante, inusitada e divertida ver a análise dela.

Esse é um resumo em números do que foi o curso!

O que eu achei do curso

EXCELENTE! Nota 10!

Eu amei o curso, o conteúdo, as aulas, os professores (Carla, José e Margaret Ann) e a turma. Por outro lado, o curso me deixou bem triste pela história do chocolate, pois enxerguei coisas que não percebia antes (e até passou pela minha cabeça desistir de trabalhar na área).

Claro que muito do conteúdo eu já sabia, pois eu estudo sobre chocolates desde 2014, mas para mim foi muito importante aprofundar o conhecimento nas questões sociais, culturais e em como fomos todos manipulados por centenas de anos para gostarmos de chocolates e consumirmos da forma que fazemos hoje.

Sim, minha conclusão é de que muito dessa história tem sido manipulação para o lucro de um grupo bem pequeno (provavelmente como acontece em muitas outras indústrias, não só a de chocolate), mas isso vou deixar para explicar em outro post.

Sei que o nicho do chocolate bean to bar (ou craft chocolate como os americanos o chamam) tem a intenção de ser e de fazer diferente, tanto em termos de fazer um produto melhor para o consumidor (chocolates mais puros e empresas mais transparentes) quanto em termos de valorização da cadeia produtiva e sustentabilidade. Se isso vai realmente vingar e crescer como um movimento sustentável a longo prazo a ponto de mudar o rumo da história, ainda não sei. Gostaria muito que isso acontecesse e meus esforços continuam nesse sentido. Por isso, sigo compartilhando o que eu descubro ou aprendo. Esse curso, eu recomendo!

Para interessados no curso, sigam as redes sociais do FCCI para saber quando a próxima turma vai acontecer ou verifique no site da Harvard.

Qualquer dúvida, pode me mandar mensagem ou deixe abaixo nos comentários.